quinta-feira, 11 de janeiro de 2018

Sobre a "Carta Aberta de Deneuve" publicada no Le Monde


Sobre a "Carta Aberta de Deneuve" publicada no Le Monde


          Uma das minhas preocupações quando falamos em Feminismo é que não devemos confundi-lo com Femismo. Feminismo busca direitos iguais entre homens e mulheres, enquanto o Femismo é o oposto de Machismo, buscando tanto poder e dominação quanto o Machismo busca. Em meus argumentos, essa diferenciação está sempre presente. A maioria das pessoas, porém, confunde os conceitos e está – legitimamente - ocupada demais com outras coisas para priorizar o entendimento desses fundamentos.
        Dito isso, gostaria de apresentar alguns pontos sobre a polêmica carta aberta publicada ontem no jornal Le Monde e que ganhou nortoriedade mundial por ser assinada por mulheres importantes, muitas das quais fizeram história defendendo a liberdade sexual feminina nas últimas décadas.
Eu só fiquei sabendo da polemica toda no final do dia de ontem porque estava ocupada com a vida e lidando com o machismo nosso de cada dia (teve todo um momento na minha tarde, que relatarei um dia desses, sobre como eu tentei comprar tintas pra minha parede e o vendedor ficou tentando me ensinar o que eu já sabia sobre pintura). Enfim, só tive acesso à Carta Aberta original em Francês hoje de manha, por isso não me posicionei antes – queria ler o original sem filtros (com um francês bem limitado, mas que deu conta da maioria das ideias) para não me contaminar com a avalanche de respostas emocionais apaixonadas (tanto à favor quanto contra) expressas em tantos sites de noticiais, blogs e redes sociais.
          Uma leitura rápida inicial, só pra ter uma ideia geral do texto, me deixou ligeiramente inquieta. Pra mim isso já é sinal de que algo não está bem, pois quando uma ideia te cativa verdadeiramente, ainda que deva ser encarada com criticidade, em geral não há duvidas ou sensações de moléstia. Uma segunda leitura, mais profunda e com a ajuda de um dicionário, me deixou incomodada.
          O texto começa com uma afirmação que resume boa parte da proposta das signatárias: “Estupro é crime, mas tentar seduzir alguém, mesmo de forma insistente ou desajeitada, não é – tampouco o cavalheirismo é uma agressão machista.” Eu já ouvi esse argumento centenas de vezes, muitas de pessoas que não tinham qualquer intencionalidade negativa, mas sim que tinham pensamentos culturalmente enraizados advindos do patriarcado em que todxs estamos inseridxs. Meu argumento sempre é: “enquanto for insistente, não é consentido e, portanto, é assédio”. Simples assim. Porém, na carta aberta o argumento é de que há uma diferença de intensidade ou grau entre um abuso sexual do tipo estupro e um homem “tocar no joelho” de uma mulher em seu local de trabalho ou “fazer comentários íntimos em uma reunião”. Uma amiga minha me encaminhou um link da resposta de um outro grupo feminista, também francês, à carta aberta. Nessa resposta, as signatárias contra-argumentam que “não se trata de uma diferença de grau, e sim de natureza”. Ainda é abuso porque trata-se de uma relação desigual de poder que se utiliza da sexualidade para dominar.
          Esse ponto me leva ao que a carta original refere defender, que seria a liberdade sexual da mulher, citando inclusive diversas ocasiões em que produções artísticas foram criticadas ou censuradas pelo que elas chamam de “puritanismo”. Eu, inclusive, concordei com parte disso porque tivemos o mesmo no Brasil há poucos meses atrás, com exposições sendo fechadas “pelo bem das crianças” (em geral as crianças brancas e de classe média/alta, porque as outras merecem pena de morte caso tropecem no diretor da firma sem querer, mas isso é outro post). Porém, na carta publicada no Le Monde, as signatárias dizem que esse puritanismo não só se excede aí, como também no que chamamos hoje de assédio e que a mulher pode gostar de ser objeto sexual de um homem. Ora, se a mulher quer ou não ser objeto sexual de alguém não é problema meu. Essa liberdade eu também defendo. Assim como defendo a mulher que deseja ser “bela, recatada e do lar” e a mulher que busca a “antimaternidade produtiva”. Eu defenderei sempre a pessoa fazer consigo mesma e com seu corpo o que ela bem entender. O que eu não defendo é que o outro possa fazer com o corpo da mulher o que ele bem entender (ou com o corpo de qualquer outro ser humano, seja ele mulher, homem, adulto, criança, adolescente ou idoso). Consentimento é chave, independente do seu gênero. Quer dizer, estaríamos realmente tendo essa conversa se um homem passasse a mão na bunda de outro homem no metrô? Pergunto assim porque na carta aberta, as signatárias minimalizam essa questão, dizendo que a mulher “pode buscar igualdade de salário e, ao mesmo tempo, não se sentir traumatizada por ser apalpada no metro”. Isso contribui para uma banalização do assédio e dá passe-livre para os homens tocarem sexualmente na mulher sem seu consentimento (não que eles já não tenham passe-livre – no Brasil, ejacular em mulher dentro do ônibus já foi considerado “não violência” por um juiz de São Paulo).
          Além dos pontos supracitados, tenho outro comentário sobre a mesma frase, no que se refere à mulher “não se sentir traumatizada”. Frequentemente vejo que as pessoas consideram que se sentir traumatizado é “mimimi”. Bom, eu tenho Doutorado em Psicologia, trabalhando com Estresse Pós-Traumatico, então tenho algum conhecimento pra compartilhar na área. Começo dizendo que eu aplaudo qualquer pessoa que passe por uma violação pessoal (seja assalto, sequestro, abuso sexual ou qualquer outra barbárie que o ser humano faz contra a própria espécie) e consiga ter resiliência para lidar com isso, encontrar estratégias de enfrentamento saudáveis e utilizar o episódio para crescer enquanto ser humano. Acho lindo. Admirável. Mas o mundo não é um moranguinho e passar por invasões como essa pode deixar sequelas emocionais para toda a vida - algumas que, sem o tratamento adequado, podem levar ao suicídio. Então, qualquer argumento em que me deixem implícito que “não se sentir traumatizado” é uma escolha sempre consciente e fácil, não é compatível com meus anos de estudo e experiência clínica. Logo, assédio pode ser trauma sim e é uma grotesca falta de empatia e alienação do mundo real ou das evidências científicas para pensar qualquer coisa diferente.
          E já que estou falando de trauma, vou me referir, à questão da vitimização da mulher. Na carta aberta, consta que o feminismo puritano de hoje em dia coloca a mulher em uma situação de vitimização eterna, deixando implícito um tom vexaminoso e fragilizado da vitimização. Ao ler, fica a sensação de que, na opinião das signatárias, dividimos o mundo entre mulheres vítimas fragilizadas e agressores demoníacos. Embora eu até observe que possa existir, de fato, um agressor demoníaco e uma vítima fragilizada, concordo que há diferentes nuances no meio do caminho - até porque o ser humano se reveza no papel de vítima e algoz em uma única vida,  em diferentes contextos, até ser capaz de romper com o ciclo. Mas é paradoxal o quanto as signatárias da carta aberta rejeitam essa dicotomia e, ao mesmo tempo, argumentam que essa vitimização é necessariamente uma fragilidade. A vitimização é um fato que pode ser tratado de diversas maneiras, mas de nenhuma forma define o valor de alguém, tampouco é vergonhosa. Nada na sua vida é vergonhoso, é simples reflexo do seu nível de maturidade e das circunstâncias da vida. Na carta em resposta do grupo feminista que citei anteriormente, elas dizem: “Somos vítimas de violência. Não nos envergonhamos. Estamos de pé. Entusiastas. Determinadas”. Esse trecho de resposta me dá uma sensação de desdramatização, de realismo. Ou seja: aceitemos os fatos. E vamos lidar com eles.
         Por fim, as signatárias da carta aberta criticam os movimentos do tipo #metoo compartilhados nas redes sociais, em que mulheres são incentivadas a denunciar publicamente seus abusadores. Elas dizem que isso os coloca numa posição negativa e que isso incomoda. Claro que incomoda, esteemos pedindo para que abram mão de privilégios, que mudem comportamentos e valores. Claro que isso incomoda. Mas isso também evolui, então lidem com isso. Elas também sugerem que os homens são acusados “sem direito de defesa” por fazerem algo que nem é tão grave assim. Chega a parecer que os homens é que são as vítimas. E alguns homens são vítimas. E existem mulheres que abusam. Claro que sim. Como diz uma colega minha, “não há o que não haja”. Mas sinceramente, se alguém rouba sua carteira no meio da rua, você vai dizer que o pobre coitado do assaltante nem tinha intenção de te machucar? Intenção é importante, claro, e tem muito assédio feito mais “por reflexo” ou mimetização cultural do que por intencionalidade perversa, mas isso de maneira nenhuma deixa de ser assédio, assim como os motivos por trás do furto da carteira não modificam a qualidade do crime.
          Dizer que assédio não é assédio é retroceder. Querer colocar panos quentes em uma situação insustentável, isso sim é vexaminoso. Mas, de novo, é simples resultado da maturidade de quem propõe a ideia. A beleza e o fardo da liberdade de expressão é essa: você pode olhar pra sua vida no final dela e pensar que disse coisas muito à frente do seu tempo, ou reler as próprias produções e torcer para haver uma próxima existência em que terá a oportunidade de refutar a si mesmx.

domingo, 31 de janeiro de 2016

As Sufragistas

Levou quase um mês inteiro para eu escrever uma resenha sobre As Sufragistas após assistir ao filme. Pra ser bem honesta, ainda não sei bem se o impacto do filme já passou ou se um dia vai passar. Doeu, doeu muito. O filme é uma dose de realidade que se mostra mais triste por ainda ser a realidade. Tudo bem, talvez no Brasil e em alguns outros países o direito ao voto para as mulheres já esteja assegurado, mas isso não significa que a mentalidade social sobre o papel da mulher e seus direitos tenha sido realmente aceito. Assim, embora o filme trate da realidade em 1918, ainda é um assunto contemporâneo.
O filme segue Maud, uma operária de uma lavanderia, casada e com um filho. O brilhantismo do longa é, na minha opinião, o fato de que Maud é uma moça comum, vivendo em uma sociedade que ela nunca antes questionou. O filme é sobre o seu despertar – e por isso talvez seja tão impactante. O despertar de Maud desperta quem se senta na cadeira do cinema para presenciá-lo.
Maud trabalha desde criança em uma lavanderia e seu salario é de posse de seu marido. Na época, mulheres não tinham o direito de gerenciar seus bens. Estes eram de posse dos homens de suas vidas. Maud nunca questionara isso. Também nunca questionara que devesse ser ouvida politicamente, ou que devesse ter a guarda do próprio filho; nunca questionara seus direitos de manter as próprias posses frente a uma separação conjugal ou que pudesse denunciar os abusos de seu empregador. Por isso, talvez uma das cenas mais incríveis do filme seja o momento em que, por um daqueles acasos da vida, ela acaba tendo que defender o voto feminino, mesmo sem ter pensado muito a respeito. Quando questionada sobre o porque de seu desejo, ela responde que é quase inacreditável “pensar que possa haver outro jeito de viver essa vida”. Este insight em frente a câmera, dito com tanta honestidade transmite um tipo de emoção diferente, mais lúcida e inteira. Não é emocionalismo barato cinematográfico, é a pura realidade expressa por alguém que finalmente entendeu algo importante. Ah, quem dera o mundo já tivesse a maturidade de Maud!
O resto do filme se passa na “luta” pelo voto feminino. Uso a palavra bélica de propósito, pois o próprio longa transmite a ideia de que a busca pelo sufrágio fora longa e pacífica por mais de 50 anos, antes de as manifestações tornarem-se violentas. Segundo Maud “a guerra é a única língua que os homens entendem”. Isso também dói: a realidade de que ainda temos dificuldade de obter direitos diplomaticamente, de que a humanidade ainda acha que precisa de armas e fronteiras para conseguir o que quer. Maud ainda deixa claro que “nós venceremos”, pois “as mulheres são metade da população humana e não podem ser, todas, paradas”, mesmo que o filme mostre as diversas formas de tortura utilizadas pelo contra-ataque masculino.
Para quem acha que feminismo é exagero, desnecessário, e que o filme retrata o que foi o passado das mulheres na sociedade, lembro que o passado ainda é presente em diversos países. Para quem for ver o filme, recomendo ficar até os créditos, pois há uma lista de anos em que o voto feminino foi aprovado nos países do ocidente, e os países em que isso ainda não aconteceu. Para quem ainda achar que o Brasil está na frente, e que não precisamos mais nos preocupar com problemas como os que Maud viveu em 1918, lembro de observar todos os casos de abusos arquivados pois as mulheres foram incentivadas a retirar as queixas contra seus abusadores, ou a estúpida polêmica do Enem, quando uma tentativa de mostrar um problema contemporâneo foi considerada golpe político durante a qual boa parte das pessoas (homens e mulheres) escreveram redações que violaram os direitos humanos.
Então, não, As Sufragistas não é apenas um filme sobre o passado, é um filme sobre o presente: é um lembrete de que é importante votarmos nas próximas eleições, mesmo que discordemos do processo político do país, porque mulheres do mundo inteiro se esforçaram para nos garantir esse direito hoje. É um filme sobre a necessidade de as mulheres (e homens) seguirem na busca pela liberdade e por tantos outros direitos que ainda não conquistamos. Acho que As Sufragistas dói, mais do que tudo, porque perto do que elas tiveram que enfrentar para nos garantir o pouco que temos hoje, nós não estamos fazendo muito para retribuir. Precisamos ser como Maud e despertar para a realidade de uma vez por todas.


quinta-feira, 2 de julho de 2015

Porque a Sandra Bullock e seu sapato amarelo de Minions são mais legais que a Camara de Deputados e a PEC


Hoje abri as paginas da internet que uso pra me atualizar da vida e me deparei com uma serie de coisas:

1. A PEC sobre redução da maioridade penal que havia sido rejeitada hoje foi aprovada após um dito “golpe”. Tem inclusive uma foto do Feliciano reivindicando com uma camiseta sobre a PEC.
2. Hoje faz 499 anos que Nostradamus morreu e aparentemente o History Channel vai exibir um documentário sobre isso.
3. A Dilma anda sendo atacada com adesivos misóginos.
4. A Sandra Bullock usou um sapato amarelo dos Mignons “por uma boa causa”.

Achei que valia uma reflexão sobre a relação entre esses eventos todos – e sim, eu acho que existe uma!
Já há algum tempo venho acompanhando o drama da PEC que resolve sobre a redução da maioridade penal no Brasil. O assunto não me interessa apenas como cidadã, mas faz parte da minha vida como psicóloga e docente.
Quem me conhece sabe que eu não acredito que punição resolva o problema de ninguém, muito menos no que se refere a adolescentes que mal tem desenvolvimento neuroquímico para entender boa parte do que fazem a longo prazo. E embora eu não seja a maior entendedora de economia, não acho de nenhuma forma vantajoso para o país aprovar a tal da PEC, considerando que nossos presídios já operam com muito menos do que o necessário para garantir os direitos humanos dos usuários – e sim, gente, por mais graves que tenha sido os crimes cometidos por esses indivíduos, eles ainda são seres humanos. Teve um cara uma vez que falava sobre atirar a primeira pedra. Eu não sou a maior fã dele, mas isso sempre fez sentido pra mim.
Estava lendo sobre algumas previsões do Nostradamus e uma especificamente se acredita falar do surgimento do Dalai Lama. “Do oriente ensinando coisas boas ao ocidente...”. Quem dera a gente aprendesse alguma coisa!

Então, só para esclarecer algumas coisas, aí vão alguns dados que muita gente não sabe.
1. O cérebro do adolescente ainda está em formação e há regiões não maduras ainda para tomar decisões adequadas. Isso não significa que eles não sabem a diferença entre certo e errado, significa apenas que eles ainda não se deram conta das implicações dessa escolha.
2. Certo e errado é uma maneira dicotômica de avaliar situações que tem muito mais do que apenas esses dois lados. Só porque alguém sabe a diferença, não quer dizer que não tenha uma serie de problemas/transtornos que dificultam aceitar que essa diferença é importante e deveria ser respeitada. Ou seja, mesmo que alguém tenha feito algo errado sabendo que era errado, pode ser que essa pessoa tenha uma doença que a impeça de entender que o errado é relevante.
3. É um grande erro achar que todo mundo teve as mesmas condições que você teve, aos 16 anos, para saber a diferença entre certo e errado e efetivamente escolher o certo. A maioria das pessoas que cometem crimes tiveram vidas bem diferentes que a sua, de forma que você não pode fazer essa comparação.
4. A maior parte dos teóricos e cientistas da área sugerem que a punição somente é eficaz a curto prazo, e que não tem o poder real de educar ou mudar comportamentos a longo prazo. A maioria das pessoas que pune quer vingança. A lei de Talião foi extinta por um bom motivo!
5. Se presídio fosse bom, não haveria população carcerária no mundo, pois não haveriam reincidentes.
6. Não faz qualquer sentido esperar que alguém se eduque através de sofrimento. Aliás, esse sempre foi meu problema com o cara que falou sobre atirar a primeira pedra. Ele também falava de pecado e culpa...

Considerando esses fatos, acho complicado ser a favor de uma medida que não apresenta qualquer benefício. Mas isso, na verdade, não importa, porque além de mim e talvez outras pessoas que se interessem e se posicionam frente ao tema, o resto dos nossos colegas cidadãos está preocupada em comprar adesivos que ofendem o gênero da presidente, como se isso fosse de qualquer forma relevante para a administração pública.

Não me entendam mal, eu sou a pessoa que fez propaganda política aberta ao Aécio na eleição passada. Eu adoraria que a Dilma deixasse de ser presidente. Mas essa posição não tem absolutamente nada a ver com o fato de que ela é mulher. É um absurdo atacar a imagem dela, como é um absurdo atacar a imagem de qualquer outra pessoa. Eu desaprovo a forma de governo dela, um direito meu. Mas não é direito de ninguém desrespeitar ela por uma questão de gênero.

Aliás, boa parte do problema da política hoje é isso. Nós votamos em uma imagem, em uma atuação/encenação, ao invés de no desempenho. Há pouco alguém tentou me lembrar que os políticos deveriam ser os representantes das nossas ideias no congresso, mas a verdade é que isso não ocorre. Os políticos tratam nossos projetos de leis como figurinhas, que são trocadas por conveniência. Boa parte deles nem mesmo sabe o que significam as leis que aprovam ou rejeitam, é só poder e dinheiro que está em questão ali. Meu irmão mais novo tinha um grupo de amigos na escola que se reunia no recreio para trocar Tazos – lembram aquelas figurinhas que vinham nos salgadinhos? É assim que eu imagino os políticos e os projetos de lei – com a diferença de que meu irmão, uma criança ainda sem muita noção de certo/errado, já era capaz de ponderar sobre o poder do seu Tazo e se era o melhor para todos que ele trocasse a figurinha. Já nossos políticos...

E pra quem acha que o Feliciano (ou qualquer outro desses atores fervorosos fantasiados de pseudo-políticos) teria qualquer intensão de pensar sobre isso, uma vez que estava lá literalmente “vestindo a camiseta”, pense de novo. Garanto que a Sandra Bullock e seu sapato amarelo de Minions pensou mais sobre a causa que estava defendendo do que toda nossa câmara de deputados.

domingo, 9 de dezembro de 2012


Cinquenta tons... de polêmica

Acabei de terminar de ler a trologia Cinquenta Tons. Estive intrigada com o livro há algum tempo, depois que estourou e metade das mulheres que eu conhecia me recomendavam a leitura e a outra metade estava ultrajada. Achei que valia à apena. Além disso, precisava me distrair.

Como distração, está aprovadíssimo! É divertido, tem um bom ritmo, especialmente os dois primeiros livros; o terceiro já é menos empolgante. E a história? Não há muita, na verdade. Não no que se refere a continuismo, tanto é que os três livros se passam em menos de 1 ano. E tudo acontece muito rápido. Pra falar a verdade, a autora nem escreve muito bem e a história não foge muito dos clichês romanticos, com a exceção do que vem excitando e ultrajando a população feminina: o sadomasoquismo.

Para os desinformados na área da literatura, a trilogia trata da história de Anastacia Steele, uma menina de 21 anos que acaba de se formar e conhece o magnata Christian Grey, de 26 anos, que tem preferências sexuais atípicas. A pobre coitada, virgem, se envolve com ele esperando nada menos que romance e ele só está interessado – a princípio – em espancá-la em seus josgos sexuais. Com o tempo, claro – e não muito tempo, devo dizer -, eles se apaixonam, mas os diferentes hábitos de Christian tornam a relação confusa e difícil.

No primeiro livro, tudo que vemos é uma mary sue virgem, ingênua e linda, em quem todos os homens estão interessados. O livro trata do conflito dela em descobrir este mundo sexual completamente diferente dos romances de Jane Eyre a que está acostumada. Ao mesmo tempo, ela está fascinada por este homem por quem vai se apaixonando aos poucos, mas que pensa ser patológico. O segundo livro é sobre desvendar as profundezas de Christian, ainda sob o ponto de vista de Anastacia. Neste livro, eles já estão cientes do que sentem um pelo outro e descobrindo e superando os traumas de Christian, que o levaram a uma vida solitária, evitativa de relacionamentos afetivos nos quais ele não achava ser capaz de se envolver. Por fim, o terceiro livro trata-se de estabilizar a nova vida dos dois, com os desafios que uma relação afetiva saudável necessita para sobreviver.

E sim, eu gosto de usar o termo saudável porque, ao contrário do que tenho lido por aí, não acho que exista algo de patológico em qualqer atividade sexual consensual, entre dois adultos que desejam ser mais “criativos”. Tenho lido algumas críticas feministas a posição de submissão em que Christian coloca Ana, principalmente porque, segundo tais críticas, trata-se de machismo. O que me chama a atenção é que a mesma revista que trata isso como machismo tem uma sessão inteira para falar de beleza: rimel, pele sedosa e unhas bem cuidadas (claro, apenas para você agradar a si mesma, imagina que absurdo querer ficar bonita para seu namorado machista, é claro que ninguém lá pensa nisso!).

Já li, também, os mesmos discursos feministas da década de 60, dizendo que a mulher não pode subter-se ao homem em nenhum contexto, que a mulher nunca será valorizada em uma posição de submissão e que a publicação deste livro, em que Ana é colocada em uma posição de submissa sexual vai contra todas as tentativas de valorização da mulher. O vilão Christian atacando a pobre vítima Anastacia. O livro deveria ser proibido, já li em algum lugar.

Ora, as mesmas pessoas que gritam por liberdade resolveram queimar livros depois do sutiã? E, por favor, esta postura de vitimização está ficando ultrapassada. Não me entendam mal, não me considero machista, mas tampouco sou feminista. Sou apenas uma pessoa vivendo em uma sociedade e utilizando meus melhores recursos pessoais para obter o que alguns chamam de felicidade. Com isso não estou dizendo que a mulher ainda não é oprimida socialmente ou que os salários femininos são compatíveis com os masculinos, por que não é bem assim. Mas sair por aí queimando livros porque eles colocam uma personagem voluntariamente interessada em dar prazer ao outro – que, por acaso, é homem – é um pouco de exageiro.

E mais! É a primeira vez em algum tempo que leio um livro em que os personagens são imperfeitos! Ela toda ingênua e confusa com relação a si mesma de forma quase irrealista e ele, como mesmo se define, danificado em cinquenta tons. O que consegui extrair desta relação não foi a superficial submissão que ultrajaram muitas mulheres, ou a empolgação sexual que libertou tantas outras, mas sim o apoio mútuo no sentido de darem-se prazer e ajudarem-se no que eram capazes. Eles evoluiram, superaram traumas profundos, feridas expostas, juntos. Desde quando doação incondicional virou sinônimo de patologia e perversidade? Pra mim significa assistência e amor. Machistas ou feministas, não é isso que todos queremos?

sábado, 8 de setembro de 2012


30 dias de vida

Às vezes me pergunto o que aconteceria comigo se eu descobrisse quando vou morrer. Eu sei, soa meio mórbido, mas pensem sobre isso. Todos sabemos que vamos morrer um dia, mas a vida é esperta o suficiente para não informar a data. É confortável, não é? Permite a ilusão de que vamos durar para sempre, que podemos fazer planos a longo prazo e que esses planos justificam fazermos coisas que não gostamos de fazer. É bom pensar que tudo vai valer a pena, que estamos plantando algo para colhermos no futuro. Às vezes me pergunto se haveria plantação se não houvesse futuro.

E eu fico pensando em números. Quando penso sobre isso, sempre imagino algo como 30 dias de vida restantes. Sei, parece dramático, mas pensem nisso por um instante: é tempo suficiente para buscar algumas coisas que sempre se quis, mas pouco tempo para se preocupar com as contas a pagar no mês seguinte. Assim, ninguém tem a desculpa de que “não tem dinheiro”. Essa é a desculpa mais aceita no mundo: “não tenho dinheiro”. Boa parte das pessoas entende que isso não é tão simples de resolver e encerra, por aí, qualquer que for o assunto.

Mas e se dinheiro não fosse o problema? Se pudéssemos estourar o limite do cartão pelo simples fato de que não estaríamos vivos para nos complicar com a conta? Eu sei, além de mórbida e dramática, estou sendo egoísta, mas vamos lá, eu só teria mais 30 dias de vida... Isso seria outra coisa boa. As pessoas compreenderiam, apoiariam e estariam presentes para qualquer de suas esquisitices, afinal, você está morrendo! Além disso, se as pessoas soubessem que você só teria 30 dias, não seria muito complicado para elas adiar alguns afazeres. Seria por pouco tempo, só 4 semanas até você morrer e elas voltarem para suas vidas imortais. 

Eu sei, mórbida, dramática, egoísta e sarcástica. Mas só por um momento, tolerem.

Todas aquelas coisas desagradáveis que fazemos para colher no futuro perderiam o sentido: não haveria futuro. Essas coisas, deixaríamos de lado.
A maior parte das pessoas provavelmente diriam que ficariam mais tempo com a família e amigos. Mas o prazo de 30 dias também é bom por isso. Imagino que boa parte de nós enjoaria de passar todo seu tempo com família e amigos, mesmo que fossem só mais 30 dias. E não seria como passar as férias com eles. É claro que não ficamos entendiados com família e amigos nas férias, mas isso é só porque ocupamos boa parte das férias para descansar. No meu cenário, descansar ficaria, literalmente, para depois.

Por fim, eu me pergunto se haveria algo que não estamos fazendo e que começaríamos a fazer no minuto seguinte à previsão de nosso óbito. Essa sim é uma grande incógnita.
Eu sei, cada um tem uma resposta diferente para meus questionamentos. Mas minha principal inquietação não está tão relacionada com a resposta em si, mas sim, em porque não priorizamos esta resposta ao invés de qualquer outra coisa.

domingo, 25 de março de 2012


O melhor de mim – Nocholas Sparks

Como toda a literatura romântico-dramática, essa eu li em apenas 5 horas. Do mesmo autor de outros dramas adaptados para o cinema, “O melhor de mim” já tinha um título atraente. E eu realmente precisava de uma literatura romântico-dramática-lição-de-vida pra variar.

O livro é sobre dois jovens que se apaixonam na adolescência e têm seu amor proibido pela família dela. Eles se reencontram, 25 anos depois, e viajam nas lembranças com a mesma intimidade e amizade que compartilharam na época.

E isso é tudo que posso dizer de bom. O resto é puro sofrimento.

Acho que Sparks está começando a confundir “drama” com “sangria desatada”. Desde quando se precisa quase matar todos os personagens pra se ter um bom livro? Ou encher todo mundo de culpa, se é que isso é relevante? Tudo bem, todo o bom drama sempre envolve sofrimento mas, lendo esse livro, eu passei em agonia constante; até agora sinto meu corpo tenso e vontade de chorar em angústia. E mesmo quando eu tive um momentozinho de felicidade, Sparks consegue, dez páginas depois, acabar com a fantasia.

Para os fãs, eu recomendo, é claro. Não posso deixar de admitir que há um fundo de beleza no fim terrível que o autor propõe. Ainda assim, eu questiono as consequências posteriores ao final. Aliás, ultimamente, devo dizer que os Epílogos andam estragando os livros pra mim. Não entendo porque os autores andam tendo essa necessidade de contar absolutamente tudo. Ninguém contou pra eles que a moral do livro é deixar um pouco para a imaginação do leitor? Acho que vou ler Machado de Assis pra tentar curar meu desânimo. Ele sim era mestre em deixar as coisas abertas à interpretações.

No fim das contas, suponho que eu já deveria ter previsto: "Um amor para Recordar" estreou como uma formidável lição de vida; "O diário de uma paixão", representou uma história de amor belíssima... e só; já "Querido John" tentou ser um drama de guerra, mas sem muito sucesso; Pela ordem natural da decadência de um autor, é claro que "O melhor de mim" seria mesmo uma ambiguidade revoltante. Tomara que Nicholas Sparks pare por aí ou retome os velhos tempos, porque, da próxima vez, não consigo pensar em como o final consiga passar de “simplesmente triste e ruim”.

sábado, 21 de janeiro de 2012


Os heróis brasileiros

“Brasileiro não desiste nunca”. Não desiste de ser idiota, isso sim! Nisso, estamos cada vez mais persistentes.

Estava vendo um vídeo do Jornal do SBT. Depois de algumas experiências que tive por aí, defini alguns parâmetros do que é e do que não é um bom jornal e uma equipe ética e descente. Neste jornal, o apresentador faz um desabafo interessante. Adicionei o vídeo para que todos tenham acesso.



O caso é que nós estamos enfrentando alguns problemas bem sérios de bom senso e juízo crítico. Eu estava hoje mesmo ouvindo uma entrevista na rádio com a Ministra sobre o Bolsa Família. Aliás, aposto que os beneficiados do bolsa família não ouviram porque os 38% que não trabalham estava assistindo ao BBB ou conversando sobre uma paraibana qualquer que resolveu voltar do Canadá.

Agora me expliquem como isso funciona: as pessoas ignoram atrocidades reais pra que possam assistir ao Bial falar sobre os “heróis” que se envolveram ou não em um estupro? E veja bem, os heróis não estavam salvando ninguém do abuso. Pô! O cara cobriu a queda do Muro de Berlin. Será que ele está satisfeito com o rumo que deu à própria carreira? Eu estive em bem menos momentos históricos que ele e estou realmente focada em fazer algo melhor que isso.

Vai parecer infantil, mas eu fui criada brincando de Princesa, assistindo Power Rangers e lendo Harry Potter. Nas minhas histórias, os heróis salvavam pessoas usando poderes extraordinários e tentavam organizar a sociedade. Quando eles agiam, as mocinhas eram salvas das bruxas e os assassinos preconceituosos, derrotados. Nas minhas histórias infantis ninguém fazia festa toda a semana pra curar o tédio de passar os outros 6 dias tomando sol à beira da piscina.

Minha infância foi muito boa. Eu tive alguns bons educadores e gente que se importava em discutir os problemas do país e do mundo. Fui educada para me responsabilizar pelas minhas ações e assumir os riscos a fim de ser uma boa pessoa. Gosto de pensa que me encaminho para conseguir ajudar a desenvolver um planeta melhor.

Não se trata de qualquer ato de heroísmo, apenas de se importar, algo cada vez mais difícil de encontrar por aí. Sim, porque enquanto alguns poucos fazem trabalho voluntário, outros muitos sobrevivem de bolsa sei-lá-o-que. Enquanto esse povo assiste ao BBB todos os dias, tem um monte de outras coisas importantes acontecendo que ninguém parece perceber.

Onde foi parar nossa consciência e a capacidade de nos importarmos realmente com algo construtivo? Porque deve haver algo muito errado em um país em que os heróis ficam bebendo até cair enquanto há tanto para ser salvo do lado de fora do confinamento.