domingo, 20 de fevereiro de 2011


127 horas

Fui assistir ao filme ontem.  Vi ao trailer e a história pareceu boa: uma história real sobre um cara que vai explorar um canyon, cai numa fenda, fica com o braço preso e não tem como pedir socorro porque não disse a ninguém para onde ia. São 127 horas da tensão psicológica que me atraiu para assistir.

No geral, o filme é bastante bom. Quer dizer, 1 ator, uma fenda e uma rocha por duas horas e eu não fiquei entediada! Excelente nesse sentido. Claro, nós vemos mais algumas pessoas porque ele se lembra da família, dos momentos que viveu e dos quais não vai viver porque acha que vai morrer, além de ter visões de como seria o seu futuro se saísse vivo dali. Na verdade, parece com alguma outra história de alguém que também ficou preso sozinho em algum lugar, mas dessa vez foi diferente. Essas idéias, pensamentos, visões que ele tem são desconexas, perdidas na mente confusa e assustada de alguém entre a vida e a morte. A tensão psicológica até aparece, é claro, mas de um jeito novo e um pouco mais realístico, eu imagino.

E, acreditem ou não, se consegue rir durante tudo isso. O cara tem um humor negro ótimo, um jeito meio negação meio depressão de encarar a morte que, embora seja terrível, faz o expectador parar de sofrer e esperar sempre o pior e encarar a coisa com certa conformidade, assim como ele mesmo estava tentando.

Claro, tem a parte do filme que precisa fazer dinheiro. Uma cena particularmente brilhante é o advertising do Gatorade. O cara está lá, a água está acabando, ele começa a guardar a própria urina para beber depois e então ele começa a viajar em pensamentos, atravessando mentalmente o deserto até chegar ao próprio carro onde deixou um Gatorade. E aí a cena corta pra ele podre, sedento e doente e, no outro lado da tela, o Gatorade geladinho, dentro do carro, esperando para ser bebido. Moral do filme? Nunca esqueça seu Gatorade, ele pode salvar sua vida! Muito bem feito, todos os comunicadores deveriam ver pelo menos essa parte e aprender a como divulgar um produto do jeito certo.

Tem uma outra moral: não esqueça nunca seu canivete suíço em casa. Se você precisar amputar o próprio braço, não vai querer fazer o serviço com algo made in China. Sim, porque, claro, pra sair dali vivo, só deixando o braço preso pra trás. Essa é a cereja do bolo. Aliás, uma bem feitinha – pelo menos a parte em que eu estava de olhos abertos para assistir. Claro, como eu esqueci de tampar os ouvidos, deu pra ouvir os gritos agoniados de dor e os ossos quebrando. Tortura. Mas tortura bem produzida, especialmente na parte em que ele tem que cortar os tendões. Terrível.  Não levem seus filhos ao cinema pra isso.

Aliás, falando em razões pelas quais as pessoas não deveriam levar os filhos nem a si próprias pra ver o filme – embora eu tenha falado bem dele até então –, há a verdadeira moral da historia.

Quem não quiser saber o final, pare por aqui.

Bom, depois de ele cortar o próprio braço, ele faz o caminho de volta e é resgatado. Ele sobrevive. Legal até aí, tanto porque eu não assisti ao filme pro cara morrer, quanto porque é realmente satisfatório saber que ele sobreviveu. Ele casa com a mulher com quem ele teve as visões na fenda e tudo! Lindo mesmo, uma história de superação. Ele tem até um filho!

E coloca um gancho no braço amputado pra continuar escalando.

Não, ele não aprendeu nada.

E o pior! Não aprendeu nada e ainda dá o péssimo exemplo pro filho! Sim, porque a moral da história é: continue arriscando estupidamente a própria vida, você vai dar sorte sempre, sobreviver sempre; basta nunca esquecer de avisar para onde vai! Isso mesmo! Inclusive, no final do filme, a gente é até informado que ele continua escalando, mas deixa um bilhete avisando pro caso de precisar de socorro.

Que alma obtusa faz um troço desses? O cara amputou o próprio braço, quase morreu e continua arriscando. E dessa vez ele não está mais sozinho no mundo, ele tem um filho! Uma criança que vai ficar sem pai porque o cara é um suicida (sim, gente, fazer esportes radicais podem ser considerado um comportamento suicida!). Eu quase entenderia a inconseqüência se ele nunca tivesse passado pela coisa toda, porque aí o sentimento de onipotência estaria mais preservado, a ilusão de “isso nunca aconteceria comigo” preservada. Mas não é o caso! Quantos avisos de que isso vai matá-lo ele precisa?

Esse filme é sobre uma pessoa de verdade e possivelmente reflete o caso de várias outras. Honestamente, eu desejo o melhor pra ele e para os demais que arriscam a vida por um pouquinho de adrenalina e algumas imagens bonitas que se acha no Google. Mas parece que ele não deseja o melhor pra si mesmo; não parece que ninguém que segue seu exemplo deseja. Um pouquinho mais de valor à vida faria toda a diferença e talvez não influenciasse tanta gente a quase se matar. Talvez não desse um filme, nem rendesse uma indicação ao Oscar e possivelmente o Gatorade não patrocinaria, mas haveria menos obituários por aí, menos filhos sem pais e bem menos sofrimento.

Bom, talvez um dia...

7 comentários:

Jeferson Cardoso disse...

Patrícia, que gostosa a sua crônica! Tenho ouvido e lido sobre o filme, todos salientam a parte da amputação, dizem que muitas pessoas têm passado mal devido àquela cena. Já estou me sentindo mal só de imaginar. [sorrio]. Parabéns por seu humor e clareza no texto!

“Para o legítimo sonhador não há sonho frustrado, mas sim sonho em curso” (Jefhcardoso)

Convido-te para que leia algo e comente no http://jefhcardoso.blogspot.com

Patricia disse...

Oi, Jefh!
Obrigada pelo comentário, fiquei bem contente.
Sobre a cena da amputação, é bem feita. Também ouvi dizer que as pessoas enjoam, mas não acho que tenha sido forte; foi real e aconteceu mesmo, então entendo porque as pessoas não se sentiriam bem. Mas eu comi um Mc quando o filme começou e ele não voltou, então...

Jeferson Cardoso disse...

Patrícia, isso prova que para amputações o seu estômago é forte. Bem, agora para Milk Shake de Micose... digo não... [sorrio]
Obrigado pelo carinho e atenção ao meu blog!

Rafael Castellar das Neves disse...

Gostei daqui...do jeito que escreve e da sua visão...neste, confesso que parei na metade, para não saber o final...rsrs

[]s

Patricia disse...

Oi, Rafael!
Obrigada pelo comentário!

Veja o filme e volte pra ler o resto. Teremos bastante para conversar...

Bjs

Cristina Tronco disse...

Sério
acabei de voltar do filme e vim correndo ler tua resenha (eu já tinha visto que tinha escrito sobre ele, mas resolvi nao ler nada p/ nao spoilear!)
Tu tinha que ter saido do cinema comigo! kkk as pessoas que assistiram comigo amaram o filme !

minha reação quando acabou foi exatamente essa! cara doido! tem que morrer mesmo! (que horror, tá eu to exagerando) mas tipo... ah... vai se F. sabe?
Não creio que isso deu um filme. Quer dizer, creio sim! cliche cliche total!

Ainda to meio indignada (alias, faz tempo que vejo um filme e não saio indignada). Poxa... na natureza selvagem (into the wild) é quase isso!
E toda situação de "near death experience" dá um filme!

Ah tá, e sem contar os momentos "jogos mortais" kkk! não pude deixar de fazer a associação!

Filme clichê + near death experience + jogos mortais = sensação do momento!

kkkkkk


Ah sei lá, to com sono e indignada... mas concordo com teus comentarios!
se bem que da parte que tu achou positiva eu so concordo com a capacidade de não ser entediante e de ter uns momentos engraçadinhos! Ah e o tendão! serio, essa vai doer em mim por alguns meses! aiiii eles conseguiram fazer um efeito sonoro/visual perfeito. Por mim podia ganhar premio só por isso!

whatever!
Saudades tuas.
Vi teu convite da dissertação! EU VOUUUUU!!!! e depois é festejar muito a noite!

To na finalera da minha! Aaarrrggg! mas vamo que vamo né?

já decidiu algo do carnaval?
no fim não planejei nada :(

beijao

Patricia disse...

CRIS!!!!!!

Sim, a gente deveria ter visto juntas! Eu saí mto indignada tb!

Vamos combinar um cine um dia desses, aí a gente sai concordando, hehe

Carnaval? SC vai sair mto caro. Tem uns amigos pensando em ir acampar no Uguguai. Quer ir?

Saudades tb!
Bjs